6 / 20

Comunidade e Comunalidade, através da acção da Anda&Fala

Miguel Mesquita

 

O Walk&Talk é um festival de artes que se realiza anualmente nos Açores. Revendo e desafiando as concepções de centralidade e periferia, o festival desenvolve uma programação de carácter internacional e, por isso, assume-se hoje como um dos eventos que marcam a agenda artística em Portugal.

 

A primeira edição do Walk&Talk ocorreu em 2011 e resultou de uma vontade disruptiva, mas conciliadora; a determinação de estabelecer um projecto que se propusesse como transformador — do espaço, de mentalidades e de atitudes — mas que fosse simultaneamente agregador e reactivo. Iniciado em plena crise financeira, o festival surgiu com o intuito de reagir ao momento e ao contexto. Esta postura conferiu-lhe uma evolução baseada numa metodologia de experimentação e questionamento, no qual o sistema é a procura de formas e espaços de entendimento e partilha. Com enfoque no desenvolvimento de projectos artísticos no espaço público, o festival tem vindo a assumir uma configuração complexa e interseccional, passando a integrar, além das artes visuais, a performance, a música, a arquitectura e o design, envolvendo um número cada vez maior de agentes do sector artístico e de instituições locais, ao mesmo tempo que associa e fomenta projectos individuais ou colectivos das comunidades de São Miguel. Neste trajecto de crescimento e evolução, a organização do festival tem procurado questionar os mecanismos de validação da arte bem como os formatos de apresentação, posicionando-se criticamente sobre os resultados e discursos produzidos.

Com a disseminação da pandemia e no seguimento das medidas de restrição anunciadas pelos Governos Nacional e Regional, o Walk&Talk optou por não realizar a sua décima edição no ano de 2020, tendo antes desenvolvido um momento intermédio ao qual chamou a edição 9.5. Um formato híbrido que considerava a adaptação à nova realidade como uma oportunidade de reflexão critica sobre a produção e apresentação de objectos artísticos no espaço digital e que, considerando esta sua condição intermédia, propôs um festival que se passava Online e Onsite. Esta dupla circunstância permitiu ao festival contornar as barreiras do isolamento insular e tornar-se verdadeiramente global, produzindo e expondo conteúdos originais, criados especificamente para o formato digital, ao mesmo tempo que mantinha uma relação próxima com o território Açoriano e as suas comunidades. O Onsite permitiu assim a inclusão e participação de parceiros-chave do festival, mitigando os efeitos económicos e sustentando uma base de confiança no evento e no trabalho que desenvolve, possibilitando ainda a inclusão de diferentes comunidades da ilha, quer através do envolvimento em projectos artísticos ou apenas assegurando a manutenção das actividades do projecto educativo, que é uma ferramenta  fundamental de partilha e construção comunitária do festival.

Esta necessidade de participação e inclusão levaram a Anda&Fala, a associação responsável pela organização e produção do festival, a iniciar o VAGA, um espaço dedicado à arte e investigação, que conta com uma galeria, uma oficina, e uma área de residência. Este espaço, ainda que possa servir de equipamento de apoio ao Festival, pretende assumir-se como uma estrutura autónoma, com uma programação regular, que sirva de plataforma de apoio e divulgação às práticas e projectos de um sistema artístico local que tem vindo a crescer, muito fomentado pelo Walk&Talk.

Com a sua décima edição a decorrer em Julho com curadoria de Ana Cristina Cachola, Jesse James e Sofia Botelho, o festival toma como mote “Será Por Onde Formos”, enfatizando a ideia de um percurso, que se constrói sem fórmulas pré-estabelecidas, e abrindo espaço à possibilidade e à descoberta.

 

Olhando para o percurso destes 10 anos do festival, converso com Jesse James (co-fundador e director artístico), Sofia Botelho (directora artística) e Luís Brum (artista, produtor, e um elemento fundamental na construção de pensamento sobre a associação), sobre formas de envolver e desenvolver comunidades em torno de um festival de artes e sobre o conceito de comunalidade como ferramenta de acção da Anda&Fala.

 

Walk&Talk

 

Miguel Mesquita é licenciado e Mestre em Arquitectura pelo Departamento de Arquitectura da FCT da Universidade de Coimbra e Mestre em Estudos Curatoriais pelo Colégio das Artes da Universidade de Coimbra. Em 2013 integrou o Centro de Estudos Sociais como Jovem Investigador em projectos interdisciplinares com foco nas áreas de arquitectura, sociologia e arte. Entre 2014 e 2015 estagiou no Museu de Arte Contemporânea da Fundação de Serralves. Foi Director Artístico da galeria BAGINSKI, entre 2015 e 2018. 

 

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.

 

Voltar ao topo